Evento de roque de empresa grande de telefonia celular - parte 1 de 3

Prólogo.


No aeroporto, embarcando, ainda não nos damos conta da magnitude do que está por vir. Na verdade, retrospectivamente, não nos daremos conta, até botarmos os pés no chão enlameado da Chácara do Jockey, quase 24 horas depois. Embarcamos embalados por músicas, individualmente. Ápice do individualismo musical, cada qual com seu discman. Excelente. Bons cds me acompanhavam. Molho meu moleton na pia do banheiro do aeroporto, pela segunda vez. A mancha lembra um búfalo avançando, irascívelmente. Uma foto é tirada. Pura Arte. A peça de vestimenta não voltaria de São Paulo. Alguma coisa tinha que ser deixada para trás, em tributo aos deuses do roque e do ruído em geral. Me protegeu bem do frio, enquanto esteve comigo. E, sim, o frio foi cortante.


Embarcamos, com nossas passagens impressas em folhas de papel A4. Ganho amendoins e suco de manga. Excelente. O Ônibus-que-voa chega rápido em São Paulo. Mal consigo ler. Duração do vôo: pouco mais do que o The Earth Is Not A Cold Dead Place. Quando inicio a audição do Will Oldham, a forte turbulência nos avisa que estamos chegando. Impossível dormir, os bancos não deixam o ângulo reto, e estão claramente amontoados o máximo possível uns sobre os outros. Linhas aéreas inteligentes. Estou feliz por ter pago pouco mais de cem reais, e ainda ganhei amendoins e suco de manga. Excelente. Uma das componentes da frota mais jovem das linhas aéreas usa a roupa mais futurista já vista em uma atendente de bordo. Deve ser parte do plano de imagem da companhia. Sim, essa linha aérea realmente é inteligente e jovial.


Sábado, 4 da manhã.

Após algumas dificuldades (um leve atraso do ônibus da gol, principalmente), rumamos de Guarulhos para o metropolitano aeroporto de Congonhas. São quatro e meia quando consigo, após o vôo e a espera no exterior do aeroporto, junto com outros passageiros mais raivosinhos pelo atraso, realmente repousar, sorvendo um doce Valv pelos canais auriculares. O banco do ônibus será o local mais confortável dos próximos dois dias. Nenhuma reclamação em relação à isso. Tudo é bom.

O aeroporto de Congonhas é hostil. Chegamos lá por volta das 5 da manhã. Poucas pessoas no aeroporto, a maioria tentando repousar em cadeiras minúsculas e, aparentemente, desconfortáveis. Um nigeriano de 2 metros dorme com as pernas sobre a mala. Se ele consegue dormir naquelas cadeiras, qualquer um consegue. Japonesas já estão por todo lugar. Japonesas e seus olhares servis e lascivos. Douglas e Renan se encantam com a aura de mistério oriental. Eu também, devo dizer.

Tentamos dormir, após algum reconhecimento das cercanias, em uma das esparsas fileiras de cadeiras. O saguão está na penumbra, algumas luzes estão acesas, apenas. Sentamos e tentamos nos aconchegar. Todas luzes do saguão se acende. Olho para o teto, ofuscado. Câmeras no teto. Não gostam de mendigos no seu aeroporto imundo. Mando um dedo médio para a câmera e me encolho na cadeira.

Acordamos as 6 da manhã, com as costas moídas. Caminho pelo aeroporto, tentando espantar o sono, ouvindo o nº 4. Entro no Brasif, recém aberto. Vejo bolas de basquete. Vou ao mostruário de maquiagem e tento passar base e sombra no rosto. Tudo para me manter acordado, e talvez ser expulso da loja (o que também pode ser encarado como um meio de me manter acordado).

Nosso generoso anfitrião nos espera em seu apartamento, nas entranhas de São Paulo. É cedo demais para irmos incomodá-lo, porém. Após uma rápida coleta de informações no balcão destinado para isso, vamos atrás da parada do ônibus Pinheiros, que nos deixaria o mais perto possível de nosso destino e local de descanso. Recebemos olhares de estranhamento cada vez que falamos parada. Ponto de ônibus? Semáforo? Tento aprender o dialeto. A comunicação é dificil. Todos imigrantes com os quais nos deparamos, nas lides diárias, por lá, falam de modo ininteligível, à primeira impressão. Demoro para entender o que o cobrador (extremamente simpático o cobrador. É totalmente aleatória, a simpatia ou não dos habitantes desta cidade. Conhecemos, no mesmo dia, o cobrador mais simpático e o taxista mais antipático) fala, mas conseguimos comunicar nossa intenção de descer na esquina das avenidas Cidade Jardim e Brigadeiro Faria Lima. Ele, solicitamente, nos avisa com um sorriso, ao chegarmos no destino.


Descemos. O céu está nublado, como esperávamos, e a temperatura está incrivelmente agradável. Porto Alegre é o pior lugar do mundo no verão, sem dúvida. Mas tergiverso. São sete da manhã, e não nos parece razoável acordar nossos anfitriões antes da nove horas, é o que nos indica o senso comum. Caminhamos pelas redondezas, em busca de comida, charutos e alguma bebida matinal. Avaliamos garotas na rua. São Paulo tem uma quantidade surpreendente de garotas agradáveis ao olhar, à seu modo. Isso que as modelos, todas, deviam estar dormindo, ainda.

O café da manhã tem lugar no boteco (e essa palavra nunca foi usada com mais propriedade. O verdadeiro boteco. Pinga sendo servida as 7 da manhã, para três fregueses, aparentemente assíduos, pois o calado atendente confraterniza com eles como se fossem colegas de escotismo), enfim, no boteco na esquina da rua em que ficaríamos hospedados. Comemos, eu e renã, o melhor pastel de queijo das nossas vidas, excetuado o servido as margens da estrada do mar, no maquiné. Insuperável. Mas o pastel era realmente bom. Bela massa. O suco de laranja, feito na hora, é incrivelmente bem servido. Aliás, característica de tudo nessa cidade. Porções gigantes. Jarras de suco. Bifes de frango do tamanho de LP´s. Douglas se mantém no café pingado e suco de laranja. Logo após, nos avisa que precisa urgentemente de um banheiro. O banheiro do boteco é inadequado até para um Ogro, apesar de belo, devido ao elevado pé direito.

Caminhamos em direção ao shopping Iguatemi, 4 quadras adiante, na vã esperança de que o mesmo se encontre aberto e receptivo à dejetos. Insucesso. Tentamos, antes de recorrer ao shopping, o banheiro de uma galeria. Na verdade, de um bar desta galeria. Sem água, o caixa nos avisa. 5 minutos depois, ao comprarmos a primeira cerveja de São Paulo, o caixa permite o acesso ao banheiro. Tánhamos que ser clientes, era só ter falado logo. Evitaria a ida até as portas trancadas do shopping. Tomamos cerveja e compramos charutos, em uma banca de jornais. O movimento é bem intenso, para um sábado de manhã. Muitas fotos são tiradas, intermitantemente.

Nove horas. Decidimos ir ao apartamento. Arruinamos com o sono de nosso anfitrião, mas precisamos dormir. Não consigo dormir, porém. Leio. Toco violão e mexo na internet, rapidamente. Renan e Douglas morrem, por algumas horas, na cama de nosso casal amigo. Vou dar mais uma ronda de reconhecimento nas redondezas. Daniel me recomenda um belo supermercado, a poucas quadras de lá, na mesma rua. Está bom, para iniciar. Não posso me perder, não saindo da rua onde estamos.

Compro alguns quitutes e bebidas, para passarmos o dia. Surpreendo-me com charutos cubanos por 12 reais. ótimos charutos. Adquiro um, por precaução. Boa comida, a vendida em São Paulo. Compro pão, queijo e lombo de porco, temperado. Como sanduíches no apartamento, e me sinto bem. A cidade está bonita e calma, apesar do choque inicial, causado pela publicidade mais intensa e agressiva de todas cidades do país. Uma tela gigante por quadra, passando comerciais non stop. Futurama. Aviões passam sobre nossas cabeças a cada 4 minutos, com regularidade impressionante, durante o dia. Durante todos os dias.

As 16:30, saímos para o festival da telefonia celular. Temos todas indicações conosco. O local da parada (ponto?), o local de descida, o trajeto e a linha à ser pega. Esperamos o ônibus sorvendo cervejas em lata, na companhia de mais um exemplar da improvável simpatia são-paulina. A velha senhora discorre longamente sobre as mudanças ocorridas no bairro em que estamos, em como ele está virando, cada vez mais, um bairro comercial. Ouvimos tudo atentamente, com um autêntico interesse. Recebemos valiosas dicas de ônibus. Aliás, somos ciceroneados, no ônibus, por ela, pois ela vai para um destino perto do nosso, e nos informa que podemos pegar o mesmo que ela (ela se certifica disso, quando o ônibus para, de maneira um tanto espalhafatosa, algo como recebemos a confirmação do destino do ônibus, entramos. Agradecemos empolgadamente à simpática senhora, e nos colocamos no meio do ônibus. Logo, um homem, perto de nós, puxa conversa, perguntando se vamos para os shows. Confirmamos, e ele, sorridente, fala algo sobre seu filho e shows, ou algo assim. Tentamos estabelecer conversa. Logo o tema muda para sotaques e regionalismos. Depois, um pouco de futebol e chegamos ao nosso destino.




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